Problema deve voltar a ser tema de debate nas eleições para prefeito deste ano

Com o esvaziamento dos centros das grandes cidades acelerado pela pandemia, revitalizar essas áreas passou a ser preocupação da gestão de algumas capitais e deve voltar a ser tema de debate nas eleições para prefeito deste ano. São Paulo, Rio, Recife e Porto Alegre têm apostado em programas para atrair moradias e empresas, especialmente nas áreas históricas, com incentivos fiscais, aumento de potencial construtivo e programas assistenciais.

Nessas capitais, as atividades comerciais e empresariais mantêm alguma movimentação destas regiões durante no dia. Mas elas ficam esvaziadas à noite e nos finais de semana, o que contribui para a insegurança.

Professora da faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Viviane Rubio aponta que há necessidade de revitalizar os centros “pelos patrimônios que guardam” e essas mudanças dependem tanto da reforma de prédios históricos quanto de incentivos para usos residenciais e comerciais.

— A gente tem a obrigação de preservar esses lugares. É a nossa memória. A ideia da revitalização é também possibilitar que você leve moradores de volta. É essencial a manutenção dos moradores tradicionais, mas também trazer gente nova — recomenda a arquiteta.

Em São Paulo, foi sancionada em 2022 a Área de Intervenção Urbana do Setor Central, que zera a outorga onerosa (taxa que as construtoras pagam à prefeitura para erguer prédios) em partes históricas como Sé, Campos Elíseos e República, e permite prédios muito mais altos que em outras regiões. Uma lei sancionada em dezembro prevê benefícios fiscais a quem instalar comércios e outras atividades não residenciais no Triângulo Histórico do Centro, como isenção de 40% no IPTU, de taxas municipais de instalação e funcionamento, e alíquota máxima de 2% no ISS para as obras na região.

Troca de calçamento

Outro projeto é a troca das pedras portuguesas por pavimento de concreto nos calçadões do Triângulo Histórico, nova iluminação e de totens com informações turísticas e de serviços. A iniciativa de R$ 63 milhões deve terminar em dezembro. Na área assistencial, o prefeito Ricardo Nunes tem nas Vilas Reencontro seu maior chamariz. São pequenas casas em contêineres para famílias em situação de rua. Três estão no Centro: no Pari, Anhangabaú e Canindé.

Em outra frente, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) promete neste ano um concurso para contratar um escritório de arquitetura que projete a nova sede administrativa do governo estadual no Centro.

— A lei de benefícios fiscais é para de trazer de volta tanto o comércio quanto para incentivar empreendimentos imobiliários, de interesse social. E também para pessoas de poder aquisitivo maior — disse o secretário municipal de Infraestrutura Urbana e Obras, Marcos Monteiro, ao apresentar as reformas para empresários da região nesta semana.

Preenchendo o vazio

No Recife, o programa Recentro, criado pelo prefeito João Campos (PSB) em 2021, pretende dar novos usos a prédios vazios no centro histórico. A cidade dá descontos de IPTU, ITBI e taxas de licenciamento para novas construções e retrofits das antigas, em especial as que tiverem habitação de interesse social. Para algumas atividades como escritórios de advocacia e arquitetura, hotéis e instituições de ensino superior, a alíquota do ISS caiu de 5% para 2% na região central.

O programa ainda contempla obras em avenidas importantes do Centro, nova iluminação pública, incentivos para aluguel social e realização de eventos na área.

— A gente tem observado um crescimento das bordas do nosso centro histórico, por meio de novos condomínios para a classe média alta, e o que a gente precisa agora é ocupar imóveis ociosos. Há um estoque imobiliário gigante de casas, sobrados e prédios — diz Ana Paula Vilaça, chefe do Gabinete do Centro, da prefeitura, reconhecendo que o maior desafio é atrair moradores para a região.

No Rio, o prefeito Eduardo Paes (PSD) aposta em cultura e em cervejarias na Rua da Carioca. Outra frente são os incentivos urbanísticos para a construção de mais residências. As políticas fazem parte do programa Reviver Centro, lançado em 2021. As empreiteiras que construírem na região ganham potencial para erguer prédios em áreas mais valorizadas, como a Barra da Tijuca e a Zona Sul. Foram permitidos prédios mais altos e isenções de IPTU, ISS e ITBI para construções no Centro.

— Estamos dando uma subvenção para atividades culturais apresentarem projetos de ocupar lojas vazias. Como contrapartida, precisam funcionar em fins de semana e horários estendidos. Com relação à população de rua, a prefeitura lançou um programa de internação involuntária — detalha o secretário de Desenvolvimento Urbano e Econômico do Rio, Chicão Bulhões.

Sem ambulantes

Em Porto Alegre, a revitalização vai da transformação do Paço Municipal no Museu de Arte de Porto Alegre à reforma de viadutos e avenidas, além de criação de incentivos fiscais e urbanísticos para atrair moradores e comerciantes. Outra medida do prefeito Sebastião Melo (MDB) foi proibir o comércio ambulante.

— É uma região que tem escola, museu, gastronomia, segurança, mas não tem gente morando — diz o prefeito. — E não vamos mais permitir ambulantes. São 180 que atuavam nas ruas. Estou dando a eles uma bolsa de R$ 1.500 por seis meses, ampliável por mais seis, para que se tornem microempreendedores individuais.

Outra medida foi uma lei que prevê que, em prédios históricos poderão ser instaladas atividades como cafeterias e livrarias com a isenção de IPTU e ISS. O benefício é previsto para 41 tipos de atividades.

Ajuda do Iphan

Em Salvador, o bairro mais famoso, que já foi alvo de um programa de revitalização ambicioso na década de 1990, voltou a ser ameaçado pelo esvaziamento, em um processo que começou há dez anos. No Pelourinho, mais de 30 imóveis estão danificados ou em ruínas. Por conta de poucos atrativos culturais, moradores foram para outros bairros e comércios fecharam as portas.

Projetos públicos e privados tentam recuperar áreas degradadas. Segundo a Companhia de Desenvolvimento Urbano da Bahia (Conder), 27 imóveis entraram em um processo de seleção no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para serem recuperados. A Fundação Mário Leal Ferreira, da prefeitura, identifica os casarões com problemas estruturais ou que precisam de reparos para reformá-los e transformá-los em moradias.

Iniciativas de países africanos também tentam reavivar a região. A Embaixada de Gana abriu em novembro a Casa de Gana, um espaço cultural que vai se juntar à Casa do Benim, a Casa de Angola e a Casa da Nigéria.

AS ESTRATÉGIAS DE CADA CAPITAL

Recife

Centro de Recife — Foto: Getty Images

Prefeitura oferece descontos de impostos e de licenciamento para novas construções e retrofits dos prédios antigos, para dar novos usos a endereços esvaziados. No caso de escritórios de advocacia e arquitetura, hotéis e instituições de ensino superior, a alíquota do ISS caiu de 5% para 2%. “Há um estoque imobiliário gigante de casas, sobrados e prédios”, diz Ana Paula Vilaça, chefe do Gabinete do Centro.

Salvador

Centro de Salvador — Foto: Paul R. Burley / Wikimedia Commons

Alvo de um programa de recuperação ambicioso nos anos 1990, o Pelourinho volta a enfrentar a ameaça de esvaziamento e conta com iniciativas culturais como a Casa de Gana, mais novo centro mantido por um país africano na região.

São Paulo

Centro de São Paulo — Foto: Edilson Dantas

Área de Intervenção Urbana do Setor Central, sancionada há dois anos, zera a taxa que construtoras pagam à prefeitura para novas obras em lugares como Sé, Campos Elíseos e República. Prefeitura aposta em casas em contêineres para abrigar famílias em situação de rua.

Rio de Janeiro

Centro do Rio de Janeiro — Foto: Brenno Carvalho

Cervejarias na Rua da Carioca e subvenção a atividades culturais são estratégias lançadas pela prefeitura, ao lado de incentivos para empresas que lançarem projetos no Centro e um programa de internação voluntária de moradores de rua.

Porto Alegre

Centro de Porto Alegre — Foto: Prefeitura de Porto Alegre

Paço Municipal será transformado no Museu de Arte de Porto Alegre, viadutos e avenidas serão reformados, e incentivos serão dados para atrair moradores e comerciantes. Outra medida do prefeito Sebastião Melo (MDB) foi proibir o comércio ambulante.


Fonte: O GLOBO