Reversão poderia paralisar casos que incluem provas originadas a partir de informações do órgão, como apurações sobre a trama golpista que resultou no 8 de Janeiro e envolvendo o crime organizado
A definição dá fôlego a investigações em andamento, já que uma reversão poderia paralisar casos que incluem provas originadas a partir de informações do órgão, como apurações sobre a trama golpista que resultou no 8 de Janeiro e envolvendo o crime organizado.
Os ministros validaram uma determinação do relator, ministro Cristiano Zanin. Em novembro de 2023, ele derrubou de forma liminar uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que havia declarado ilegais relatórios do Coaf requisitados diretamente pela polícia e pelo MP.
— Os relatórios emitidos pelo Coaf podem ser compartilhados espontaneamente ou por solicitação dos órgãos de persecução penal para fins criminais, independentemente de autorização judicial — afirmou Zanin na terça-feira.
'Manifesto descompasso'
Ele foi acompanhado por Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes. Os ministros entenderam que a decisão do STJ desconsiderou uma determinação anterior do Supremo, de 2019, que já autorizava o compartilhamento.
— Parece ter havido o que a gente chama de manifesto descompasso — afirmou Cármen Lúcia.
A posição foi reforçada pelo presidente da turma, Alexandre de Moraes:
— É flagrante a contradição com o que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal — afirmou Moraes, acrescentando: — Na verdade, (o STJ) leu pela metade o julgamento.
No ano passado, a Sexta Turma do STJ havia estabelecido que a polícia e o MP não poderiam solicitar relatórios de inteligência financeira diretamente ao Coaf.
Entretanto, o Ministério Público Federal (MPF) recorreu ao STF contra a decisão. Na época, investigadores alertaram que apurações que estavam em andamento ou que tinham resultado em operações e até mesmo prisões poderiam ser prejudicadas caso a medida fosse mantida.
Zanin concordou com os argumentos do MPF e derrubou a decisão. Entretanto, houve um recurso, que foi negado agora.
Os relatórios de inteligência, chamados de RIFs, são o resultado de análise de comunicações recebidas e de intercâmbio de informações financeiras. Quando o Coaf observa indícios de lavagem de dinheiro ou outro ilícito, o documento é encaminhado à autoridade competente por investigar.
Este tipo de relatório é usado, por exemplo, em investigações sobre o financiamento de acampamentos em frente a quartéis após a eleição de 2022 e na trama golpista que resultou no 8 de Janeiro. Investigadores também se basearam em informações do Coaf para reunir indícios em investigações envolvendo lavagem de dinheiro de facções do crime organizado. Recentemente, a Polícia Federal usou dados do Coaf para a apontar que a mulher de um dos presos no caso Marielle fez saques em espécie que chegaram a R$ 760 mil em dois anos.
Os órgãos de investigação apontam que esses relatórios não configuram quebras de sigilo, porque seguem parâmetros estabelecidos pela legislação e por normas do próprio Coaf. A partir destes alertas, podem se dar eventuais pedidos envolvendo dados protegidos pelo sigilo bancário.
Em 2019, o ministro Dias Toffoli chegou a suspender todos os processos judiciais em que dados bancários de investigados tinham sido compartilhados sem autorização prévia do Poder Judiciário, atendendo a pedido do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Ele era investigado por suposta prática de rachadinha em seu gabinete quando era deputado estadual. Na época, o MPF contabilizou 935 investigações paralisadas em todo país devido à decisão.
Análise caso a caso
Em novembro daquele ano, o plenário do STF derrubou a decisão de Toffoli e estabeleceu o entendimento de que a autorização não é necessária. A tese aprovada na época determina que “é constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira” com os “órgãos de persecução penal para fins criminais, sem a obrigatoriedade de prévia autorização judicial”.
Um dos temas discutidos na terça-feira foi a possibilidade do compartilhamento de informações facilitar a chamada “pescaria probatória” que ocorre quando os órgãos de investigação utilizam uma coleta de dados para conseguir eventuais novos elementos contra um alvo.
— Nós não podemos presumir que a solicitação resultará em pescaria probatória, como uma espécie de fatalismo, como uma nulidade presumida. Deve ser aferido caso a caso — afirmou Dino.
Para Fux, o julgamento do STF privilegiou a prática de “seguir o dinheiro” e cabe à polícia garantir o sigilo das informações coletadas. Cármen Lúcia fez a ponderação de que é preciso garantir o sigilo dos dados.
Relatórios miram lavagem de dinheiro
Fonte: O GLOBO
Os ministros validaram uma determinação do relator, ministro Cristiano Zanin. Em novembro de 2023, ele derrubou de forma liminar uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que havia declarado ilegais relatórios do Coaf requisitados diretamente pela polícia e pelo MP.
— Os relatórios emitidos pelo Coaf podem ser compartilhados espontaneamente ou por solicitação dos órgãos de persecução penal para fins criminais, independentemente de autorização judicial — afirmou Zanin na terça-feira.
'Manifesto descompasso'
Ele foi acompanhado por Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes. Os ministros entenderam que a decisão do STJ desconsiderou uma determinação anterior do Supremo, de 2019, que já autorizava o compartilhamento.
— Parece ter havido o que a gente chama de manifesto descompasso — afirmou Cármen Lúcia.
A posição foi reforçada pelo presidente da turma, Alexandre de Moraes:
— É flagrante a contradição com o que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal — afirmou Moraes, acrescentando: — Na verdade, (o STJ) leu pela metade o julgamento.
No ano passado, a Sexta Turma do STJ havia estabelecido que a polícia e o MP não poderiam solicitar relatórios de inteligência financeira diretamente ao Coaf.
Entretanto, o Ministério Público Federal (MPF) recorreu ao STF contra a decisão. Na época, investigadores alertaram que apurações que estavam em andamento ou que tinham resultado em operações e até mesmo prisões poderiam ser prejudicadas caso a medida fosse mantida.
Zanin concordou com os argumentos do MPF e derrubou a decisão. Entretanto, houve um recurso, que foi negado agora.
Os relatórios de inteligência, chamados de RIFs, são o resultado de análise de comunicações recebidas e de intercâmbio de informações financeiras. Quando o Coaf observa indícios de lavagem de dinheiro ou outro ilícito, o documento é encaminhado à autoridade competente por investigar.
Este tipo de relatório é usado, por exemplo, em investigações sobre o financiamento de acampamentos em frente a quartéis após a eleição de 2022 e na trama golpista que resultou no 8 de Janeiro. Investigadores também se basearam em informações do Coaf para reunir indícios em investigações envolvendo lavagem de dinheiro de facções do crime organizado. Recentemente, a Polícia Federal usou dados do Coaf para a apontar que a mulher de um dos presos no caso Marielle fez saques em espécie que chegaram a R$ 760 mil em dois anos.
Os órgãos de investigação apontam que esses relatórios não configuram quebras de sigilo, porque seguem parâmetros estabelecidos pela legislação e por normas do próprio Coaf. A partir destes alertas, podem se dar eventuais pedidos envolvendo dados protegidos pelo sigilo bancário.
Em 2019, o ministro Dias Toffoli chegou a suspender todos os processos judiciais em que dados bancários de investigados tinham sido compartilhados sem autorização prévia do Poder Judiciário, atendendo a pedido do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Ele era investigado por suposta prática de rachadinha em seu gabinete quando era deputado estadual. Na época, o MPF contabilizou 935 investigações paralisadas em todo país devido à decisão.
Análise caso a caso
Em novembro daquele ano, o plenário do STF derrubou a decisão de Toffoli e estabeleceu o entendimento de que a autorização não é necessária. A tese aprovada na época determina que “é constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira” com os “órgãos de persecução penal para fins criminais, sem a obrigatoriedade de prévia autorização judicial”.
Um dos temas discutidos na terça-feira foi a possibilidade do compartilhamento de informações facilitar a chamada “pescaria probatória” que ocorre quando os órgãos de investigação utilizam uma coleta de dados para conseguir eventuais novos elementos contra um alvo.
— Nós não podemos presumir que a solicitação resultará em pescaria probatória, como uma espécie de fatalismo, como uma nulidade presumida. Deve ser aferido caso a caso — afirmou Dino.
Para Fux, o julgamento do STF privilegiou a prática de “seguir o dinheiro” e cabe à polícia garantir o sigilo das informações coletadas. Cármen Lúcia fez a ponderação de que é preciso garantir o sigilo dos dados.
Relatórios miram lavagem de dinheiro
- O que é um Relatório de Inteligência Financeira do Coaf: Os RIFs são resultado de análise de comunicações recebidas e de intercâmbio de informações financeiras. Quando o Coaf observa indícios de lavagem de dinheiro ou movimentação atípica, o documento é encaminhado à autoridade competente para investigação.
- O que foi decidido na terça-feira: O STF validou decisão liminar de novembro passado do relator, Cristiano Zanin, autorizando que a polícia e o Ministério Público podem solicitar os relatórios diretamente ao Coaf sem prévia autorização judicial e que não se configura quebra de sigilo bancário.
- O que tinha sido decidido antes: A Sexta Turma do STJ estabeleceu, em agosto de 2023, que a autoridade policial não poderia solicitar relatórios de inteligência financeira diretamente ao Coaf, sem autorização da Justiça. A decisão foi tomada em um caso envolvendo apurações sobre lavagem de dinheiro no Pará, mas o MPF recorreu ao STF, que em 2019 já tinha se manifestado em sentido contrário.
- Flávio Bolsonaro: Em 2019, o ministro Dias Toffoli, então presidente do STF, chegou a suspender todos os processos judiciais em que dados bancários de investigados tinham sido compartilhados sem autorização prévia do Judiciário, atendendo a pedido do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Ele era alvo de investigação por suposta prática de rachadinha em seu gabinete quando era deputado estadual. Em novembro daquele ano, o plenário do STF derrubou a decisão de Toffoli e estabeleceu o entendimento de que a autorização não é necessária. O processo de Flávio, contudo, foi arquivado por incompatibilidade de foro.
- Outros casos: Na época, o MPF contabilizou 935 investigações paralisadas em todo país devido à decisão de Toffoli. Só na Alerj, 22 deputados, além de Flávio, se tornaram alvo do MP em 2018, incluindo o ex-presidente da Casa André Ceciliano. O caso dele também foi arquivado. Outra investigação envolvia o ex-PM Ronnie Lessa, acusado de matar a vereadora Marielle Franco (PSOL). Ele havia sido preso preventivamente porque o Coaf apontou um depósito para ele de R$ 100 mil em dinheiro vivo.
Fonte: O GLOBO
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