A influenciadora Norraina Dourado, que sobreviveu aos incêndios em Dumont, no interior paulista — Foto: Arquivo Pessoal
No fim da tarde, pouco antes da fumaça provocar aquela escuridão, nós nos lembramos dos animais que vivem na pousada onde minha trabalha, na zona rural. Lá tem cachorro, gato, cavalo. Fomos eu e meu irmão no meu carro e minha mãe em outro. Na metade do caminho, vimos um redemoinho de fogo, desses que têm aparecido muito na região nos últimos dias.
O redemoinho jogou o nosso carro longe, em cima de cana-de-açúcar recém-plantada que começou a pegar fogo. O carro começou a esquentar e os vidros a trincar. Da saída do ar-condicionado, vinham brasas. Meu irmão e eu ficamos com muito medo do carro explodir e decidimos sair correndo para algum lugar onde não houvesse fogo e tentar encontrar nossa mãe.
Saltamos do carro de mãos dadas e saímos correndo. Era tanta fumaça um não via o outro, só víamos nossas mãos dadas. Sem perceber, meu irmão perdeu os chinelos e queimou as solas dos pés. Eu precisei carregá-lo. Nem sei como consegui, porque ele é muito maior que eu. Ele tem 18 anos e 1,80 metro.
Saltamos do carro de mãos dadas e saímos correndo. Era tanta fumaça um não via o outro, só víamos nossas mãos dadas. Sem perceber, meu irmão perdeu os chinelos e queimou as solas dos pés. Eu precisei carregá-lo. Nem sei como consegui, porque ele é muito maior que eu. Ele tem 18 anos e 1,80 metro.
Eu tenho 26 anos e 1,60 metro. Conseguimos chegar a um pedaço da estrada que não estava pegando fogo, ainda que estivéssemos rodeados pelo incêndio. Nessa hora, minha tia conseguir falar com a gente e, em seguida, minha mãe ligou. Ela estava nos procurando, mas estávamos do lado oposto dela.
Lá longe, eu vi pisca-alerta do carro ligado e decidi ir até ela. Meu irmão não conseguia andar por causa dos pés queimados. Foi muito difícil deixá-lo lá sozinho. Eu ainda ouço ele gritando que não queria ficar ali sozinho, que não queria morrer queimado. Ele estava desesperado, achava que eu não ia conseguir voltar. Foi muito difícil, mas saí correndo até o carro da minha mãe.
Lá longe, eu vi pisca-alerta do carro ligado e decidi ir até ela. Meu irmão não conseguia andar por causa dos pés queimados. Foi muito difícil deixá-lo lá sozinho. Eu ainda ouço ele gritando que não queria ficar ali sozinho, que não queria morrer queimado. Ele estava desesperado, achava que eu não ia conseguir voltar. Foi muito difícil, mas saí correndo até o carro da minha mãe.
No caminho, eu inalei muita fumaça. Achei que fosse desmaiar, minha vista até escureceu. Cheguei lá e havia fogo por toda a parte, mas não via a minha mãe. Foi desesperador. Finalmente eu a vi lá longe, perto de uma árvore caída.
Peguei o carro e fui buscar o Wesley. Ele estava com muita dor por causa das queimaduras. Não conseguia pôr os pés no chão. No carro, ele apoiou os pés no painel, que ficou coberto de sangue. Depois, voltamos para buscar nossa mãe.
Peguei o carro e fui buscar o Wesley. Ele estava com muita dor por causa das queimaduras. Não conseguia pôr os pés no chão. No carro, ele apoiou os pés no painel, que ficou coberto de sangue. Depois, voltamos para buscar nossa mãe.
Ficamos conversando com ela pelo telefone e acendemos o pisca-alerta para ela conseguir ver o carro no meio do fogo. Ela atravessou o fogo e não se queimou. Só se ralou um pouco porque caiu em cima de cascalho.
Fomos direto para o hospital. Eu não me lembro do caminho até lá. Só de algumas imagens da estrada. Tanto que lá no hospital eu tentava levantar da cama e ir embora, porque não sabia onde estava. Até que uma médica me acalmou, me mostrou que eu estava no hospital, que estávamos sendo atendidos. Tive queimaduras de primeiro grau.
O calor do fogo queimou até dentro do meu nariz. Eu cheguei ao hospital sem conseguir respirar. Fui liberada na madrugada de sábado para domingo, quando já conseguia respirar sem oxigênio.
Lá do hospital, minha prima já tinha postado um vídeo, mostrando que estávamos sendo atendidos. Nossa cidade tem 10 mil habitantes. As notícias correm rápido e muita gente estava ligando e saindo para nos procurar.
Eu comecei a trabalhar com internet a três anos e hoje vivo disso. No meu perfil no Instagram, @norrainadouradoofc_, falo principalmente sobre rodeio. Mostro os animais e os bastidores da competição. Compartilhei um vídeo lá assim que cheguei em casa para informar quem estava preocupado de que estávamos todos bem. Não imaginava o tamanho da repercussão que viria.
Meu irmão foi levado para Ribeirão Preto e está neste momento (quarta-feira à tarde) no centro cirúrgico. Estou falando com você no viva-voz para ver caso minha mãe ligue com notícias. Mas ele está bem. Minha mãe e eu ficamos impressionadas com a força dele. Anteontem, voltamos à pousada, o fogo rodeou tudo, mas não chegou onde estávamos os animais.
Eu estive no meio do fogo e tenho certeza de que foi criminoso. Aqui no interior, estamos acostumados com queimada durante o tempo seco. Mas nunca uma coisa tão intensa como foi agora. Eram muitos focos de incêndio. Se precisasse evacuar a cidade, não ia ter como. A Polícia Rodoviária Federal fechou as três saídas por causa do fogo. Não tinha como passar. Os incêndios foram criminosos. Tenho convicção disso.
*Em depoimento a Ruan de Sousa Gabriel
Fonte: O GLOBO
Lá do hospital, minha prima já tinha postado um vídeo, mostrando que estávamos sendo atendidos. Nossa cidade tem 10 mil habitantes. As notícias correm rápido e muita gente estava ligando e saindo para nos procurar.
Eu comecei a trabalhar com internet a três anos e hoje vivo disso. No meu perfil no Instagram, @norrainadouradoofc_, falo principalmente sobre rodeio. Mostro os animais e os bastidores da competição. Compartilhei um vídeo lá assim que cheguei em casa para informar quem estava preocupado de que estávamos todos bem. Não imaginava o tamanho da repercussão que viria.
Meu irmão foi levado para Ribeirão Preto e está neste momento (quarta-feira à tarde) no centro cirúrgico. Estou falando com você no viva-voz para ver caso minha mãe ligue com notícias. Mas ele está bem. Minha mãe e eu ficamos impressionadas com a força dele. Anteontem, voltamos à pousada, o fogo rodeou tudo, mas não chegou onde estávamos os animais.
Eu estive no meio do fogo e tenho certeza de que foi criminoso. Aqui no interior, estamos acostumados com queimada durante o tempo seco. Mas nunca uma coisa tão intensa como foi agora. Eram muitos focos de incêndio. Se precisasse evacuar a cidade, não ia ter como. A Polícia Rodoviária Federal fechou as três saídas por causa do fogo. Não tinha como passar. Os incêndios foram criminosos. Tenho convicção disso.
*Em depoimento a Ruan de Sousa Gabriel
Fonte: O GLOBO
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