Confusão em ato de campanha na Zona Leste de São Paulo reverteu tendência de pesquisas por conexão entre ex-coach e facção estimuladas por rival

Pablo Marçal no debate da Band — Foto: Edilson Dantas/O Globo

Porto Velho, Rondônia - O alarde criado em torno de um suposto atentado contra o candidato do PRTB à prefeitura de São Paulo, Pablo Marçal, na última sexta-feira (30) teve o efeito de reverter um pico de buscas que ligavam ex-coach à facção Primeiro Comando da Capital (PCC), segundo um levantamento da equipe da coluna com base na ferramenta Google Trends.

Os dados da plataforma indicam que o interesse dos usuários em buscas associando Marçal à organização criminosa ganhou tração ao longo daquele dia, após a campanha do prefeito e candidato à reeleição, Ricardo Nunes (MDB), veicular nas emissoras de rádio inserções que convocavam os ouvintes a pesquisar os termos “Pablo Marçal” e “PCC”.

A tendência de buscas vinha subindo desde a manhã de segunda. Às 15h18m, a equipe de Marçal acionou a Polícia Militar e relatou a presença de um “homem armado” que teria ameaçado o candidato durante um ato na Zona Leste da cidade e fugido em um carro após ser abordado pelos seguranças de Marçal, que chegou a vestir um colete à prova de balas às pressas.

Depois que o episódio veio à tona, a curva de interesse por Marçal e PCC caiu, e a pesquisa sobre Marçal e o atentado subiu.

Gráfico do Google Trends compara interesse de buscas por "Pablo Marçal PCC" (em azul) e "Pablo Marçal atentado" (em vermelho) e indica pico de pesquisas nos dias 30 e 31 de agosto — Foto: Reprodução

No entanto, como revelou o portal Metrópoles nesta terça-feira (3), o candidato não mencionou qualquer armamento no boletim de ocorrência registrado por ele no Departamento de Homicídio e Proteção à Pessoa da Polícia Civil.

A inversão na tendência de buscas se deu tanto a nível nacional quanto em São Paulo, ainda segundo o Google Trends. A busca estimulada por Nunes levava a diversas reportagens e artigos que esmiuçam as conexões ainda não esclarecidas entre o candidato e alguns de seus correligionários do PRTB e a facção criminosa.

A única imagem disponível sobre o episódio é um vídeo gravado por um integrante da equipe de Marçal que mostra a candidata a vereadora Carolina Iara (PSOL) sendo perseguida por um segurança do ex-coach que se identifica como “polícia”. Ela entra em um Ford Ka cinza, que deixa o local às pressas pela contramão. Nenhuma arma é vista na gravação.

Mais tarde, Iara publicou um vídeo nas redes sociais relatando ter se aproximado de Pablo Marçal em um “ato pacífico” para entregar um boneco de isopor no formato de Pinóquio, personagem ficcional associado a mentiras, mas que deixou o local diante da “truculência” dos apoiadores.

“Estão tentando ligar esse vídeo a um suposto atentado. Olha só que absurdo. Não acreditem nessa mentira. Eu passei o dia fazendo campanha eleitoral”, disse a candidata do PSOL, mesmo partido de Guilherme Boulos, rival de Pablo Marçal e líder nas principais pesquisas de intenção de voto para prefeito.

Perfis apoiadores do candidato do PRTB rapidamente disseminaram a versão de uma tentativa de homicídio nas redes sociais, e a narrativa ganhou corpo. O portal da produtora Brasil Paralelo publicou na tarde de sexta que o ex-coach havia sido alvo de uma “tentativa de assassinato” por volta das 15h50m. Políticos como o vereador Rubinho Nunes (União Brasil) e o deputado estadual Capitão Telhada (PP) logo associaram o episódio ao PSOL.

A sequência de ruídos provocou uma mudança brusca na tendência de pesquisas que enfraqueceu a estratégia de Ricardo Nunes de explorar a suposta associação de Marçal com o PCC nos rádios. O candidato do PRTB, que ultrapassou Nunes na última rodada de pesquisas do Datafolha e da Quaest, tem sido questionado por adversários pela proximidade de integrantes de seu partido com a facção.

O presidente da legenda, Leonardo Avalanche, fiador da candidatura de Marçal, foi gravado se vangloriando de sua alegada ligação com a organização criminosa, incluindo uma articulação para libertar André do Rap, um dos líderes do Primeiro Comando da Capital. O teor do áudio foi revelado pela Folha de S. Paulo.

Outros dois membros da cúpula do PRTB, Tarcísio Escobar e Júlio César Pereira, conhecido como Gordão, foram indiciados pela Polícia Civil por envolvimento com o PCC. Ambos articularam com Avalanche a eleição do grupo no partido em fevereiro.

A principal linha de investigação do inquérito da Polícia Civil indica que os dois, que são sócios, atuavam como “investidores” do tráfico, ao ceder carros de luxo para bancar a aquisição de drogas por meio de um esquema mantido por Francisco Chagas de Sousa, o Coringa.

A repercussão do caso, porém, foi ofuscada pelo o aparente factoide promovido pela campanha de Marçal.

Só na última segunda-feira (2) o interesse pelo “atentado” perdeu tração a ponto de voltar a ser superado pela vinculação entre o ex-coach e o PCC – ainda assim de forma mais tímida do que no pico de buscas sobre o suposto ataque na última sexta-feira.

A ferramenta do Google permite analisar tendências de buscas a nível nacional ou estadual a partir de comparações entre termos de buscas, mas não apresenta números absolutos do volume de pesquisas de cada um deles.

O episódio do suposto atentado, porém, não parece ter desanimado Nunes. O prefeito do MDB redobrou a aposta na estratégia nesta terça-feira ao veicular nos rádios outra gravação sugerindo uma nova pesquisa na plataforma de buscas.

Desta vez, o comando leva o usuário à repercussão da reportagem do UOL que revelou no último domingo (1) grampos da Polícia Federal que implicaram o hoje candidato à prefeitura na investigação de um esquema de fraudes bancárias em Goiás, onde nasceu. Marçal foi preso em 2005, mas respondeu em liberdade. O ex-coach foi condenado pelo episódio, mas a pena prescreveu em 2018.

“Gente, vamos conhecer melhor o Pablo Marçal? Digita no Google aí, ó: áudio Marçal Polícia Federal. Quer conhecer melhor o passado do Marçal? Digite no Google: áudio Marçal Polícia Federal. A gente tem que conhecer o passado de todo mundo”, diz a gravação divulgada pela campanha de Nunes.


Fonte: O GLOBO